Apesar de ser um dos eventos científicos mais meticulosamente registrados na história recente da humanidade, muitos aspectos da criação da bomba nuclear permanecem um mistério. A nova cinebiografia de Christopher Nolan Oppenheimer – baseado na vida do físico homônimo amplamente considerado o pai da bomba – procura aprofundar algumas dessas questões que não estão tão enraizadas na ciência, mas sim na psicologia.
J. Robert Oppenheimer era um personagem fascinante (teria que ser para justificar um filme com três horas de duração). Embora ele fosse politicamente de esquerda e profundamente envolvido com o espiritualismo, no fundo ele era um cientista, linguista e historiador genial. Então, por que um homem que doou para causas de esquerda e foi intensamente versado na filosofia hindu decidiu tentar fazer uma arma tão destrutiva e nova que alguns pensaram que poderia incendiar a atmosfera e destruir o mundo inteiro? Seria o espectro do nazismo? Um interesse científico levado longe demais? Ou uma combinação de fatores? Leia adiante para descobrir por que Oppenheimer se juntou ao Projeto Manhattan.
Quem foi J. Robert Oppenheimer?
J. Robert Oppenheimer foi um brilhante físico teórico, polígota e conferencista. Ele nasceu na cidade de Nova York em 1904, filho de ricos imigrantes judeus-alemães, e seu gênio científico era óbvio desde uma idade incrivelmente jovem – tanto que ele impressionou os membros do New York Mineralogical Club o suficiente para convidá-lo para dar uma palestra na tenra idade de 12 anos.
Ele então estudou química em Harvard, mas depois de se formar o primeiro da turma decidiu mudar para a física. Ele acabou na Universidade de Cambridge, no Reino Unido, onde trabalhou com um vencedor do Prêmio Nobel e começou sua pesquisa sobre átomos. Logo ele estava na Alemanha, na Universidade de Göttingen, onde foi convidado para fazer algumas pesquisas pelo influente diretor do Instituto de Física Teórica – Max Born. Durante esse tempo, ele publicou uma série de artigos influentes e bem recebidos que contribuíram fortemente para o novo campo da teoria quântica.
Em 1927, Oppenheimer recebeu um doutorado e tornou-se professor na Califórnia. Ele mesmo admitiu que não estava muito envolvido com o mundo da política, concentrando-se mais em seu trabalho. Durante esse período, ele foi indicado ao Prêmio Nobel três vezes, embora nunca tenha ganhado nenhum. Sua pesquisa continuou a contribuir fortemente para vários campos, incluindo os da física nuclear, da teoria quântica de campos e até mesmo da astrofísica.
Com a ascensão da Alemanha nazista na década de 1930, os instintos políticos de Oppenheimer foram finalmente liberados. Ele começou a doar dinheiro para ajudar cientistas judeus que fugiam do regime e se envolveu em várias organizações de esquerda – atividade que mais tarde o levaria a ser acusado de comunismo durante a histérica e ridícula era McCarthy. Foi nessa época que ele tinha um arquivo do FBI compilado sobre ele, mas também foi abordado pelo governo para trabalhar no projeto mais secreto que já havia recebido luz verde: uma tentativa de criar uma arma nuclear, codinome Projeto Manhattan.
Por que Oppenheimer se juntou ao Projeto Manhattan?
Oppenheimer juntou-se ao Projeto Manhattan por vários motivos. Em primeiro lugar, estava sua crença de que os cientistas alemães tinham a capacidade de fabricar armas nucleares. Seu tempo estudando no país, combinado com seu medo muito real do poder e violência crescentes da Alemanha nazista, foi o ímpeto de que ele precisava para garantir que os americanos chegassem lá primeiro.
Igualmente importante, seus interesses de trabalho fizeram dele a pessoa ideal para liderar o projeto. Ele tinha uma compreensão firme não apenas da física nuclear que era vital para criar a explosão real, tendo trabalhado intensamente em cálculos de nêutrons rápidos, mas também da natureza mais física de coisas como a construção de balística. É por isso que ele foi escolhido antes de outros cientistas com mais experiência, além de coisas como prêmios Nobel. Ele também era bem visto nos círculos acadêmicos, pois muitos admiravam sua genialidade.
Sua personalidade e motivação também foram fundamentais para que ele fosse selecionado para o cargo pelo general Leslie Groves, o homem encarregado de administrar o projeto do ponto de vista militar. O general considerou o histórico interdisciplinar de Oppenheimer e o escopo de seu conhecimento vitais para o projeto. Esta provou ser a escolha correta, pois Oppenheimer não apenas se tornou um mestre em gerenciamento de projetos, mas também foi visto como uma inspiração e um excelente condutor dos cientistas que trabalharam sob seu comando.
Como foi trabalhar no Projeto Manhattan?
Oppenheimer transferiu as operações para o Novo México, onde ele e um seleto grupo de mentes incríveis começaram a trabalhar na fabricação de armas nucleares. O local que escolheram se chamava Los Alamos e foi escolhido por seus amplos espaços abertos, relativo isolamento e terreno plano. Também ficava perto do rancho de Oppenheimer, então ele conhecia a área relativamente bem.
Em um raro erro, Oppenheimer inicialmente subestimou o quão grande o projeto acabaria sendo. Na época do Trinity, o primeiro teste de bomba, o número de pessoas que trabalhavam em Los Alamos era bem mais de 6.000. Embora tenha lutado com essa escala no início, Oppenheimer logo se tornou especialista em gerenciar os vários grupos de cientistas, engenheiros e militares com os quais trabalhava, além de garantir que os diferentes grupos tivessem um senso de unidade.
O projeto não estava inicialmente focado em fazer um dispositivo explosivo. Idéias tão malucas quanto usar veneno radioativo para contaminar alimentos e suprimentos de água foram lançadas, assim como armas do tipo revólver. No entanto, em 1942, Oppenheimer decidiu que uma arma do tipo implosão era o melhor caminho a seguir e transferiu todas as equipes de Los Alamos para trabalhar nesse tipo de arma nuclear.
Em 16 de julho de 1945, ocorreu o primeiro teste de bomba – apelidado de Trinity em homenagem a um verso de John Domme. Menos de um mês depois, os EUA lançaram duas bombas sobre o Japão, e a guerra logo chegou ao fim.
Quais eram os pensamentos de Oppenheimer sobre armas nucleares?
Oppenheimer teve um relacionamento muito misto com as armas nucleares que mudou ao longo do resto de sua vida, terminando com a crença de que elas precisavam ser fortemente regulamentadas por agências internacionais criadas especificamente para essa tarefa. Inicialmente, porém, ele ficou chateado por eles não terem tido a chance de usar as armas na Alemanha nazista, mas supostamente ficou perturbado quando descobriu que uma segunda bomba havia sido lançada no Japão, acreditando ser cruel e exagerada. Ele chegou a dizer ao presidente Truman que havia sangue em suas mãos, ao que o presidente reagiu com petulância infantil, banindo Oppenheimer de seu cargo.
O cientista também se opôs notoriamente ao desenvolvimento de uma bomba H ainda mais poderosa, uma crença que foi distorcida por oponentes políticos e conservadores sedentos de sangue que estavam ansiosos para escalar a Guerra Fria. Eles alegaram que sua antipatia pela ideia de uma bomba H vinha das simpatias soviéticas, embora fosse inteiramente devido à sua crença de que a bomba era tecnicamente muito perigosa para tentar fabricar, além de danificar e desperdiçar desnecessariamente. Isso acabou levando Oppenheimer a ser destituído de sua autorização do governo, bem como de seu exílio político e acadêmico por muitos anos. No entanto, antes de sua morte, ele foi recebido de volta ao redil por JFK e, após o assassinato do presidente, Lyndon B. Johnson.
Oppenheimer passou o resto de sua vida lutando pelo controle internacional de armas nucleares e energia atômica, até sua morte de câncer na garganta em 1967. Apesar do fato de não haver nenhum ser humano em melhor posição para nos alertar sobre as ameaças que vêm com a natureza impressionante da energia nuclear, seus gritos de guerra por regulamentação ainda estão caindo em ouvidos surdos.